Faz todo sentido o Professor X ser negro no MCU e nós podemos provar
Nos anos 60, sob a tutela do lendário Stan Lee, os X-Men foram apresentados ao mundo. Uma equipe de jovens buscando aceitação, lidando não apenas com as dificuldades do dia a dia, mas também com a discriminação da sociedade. Soa familiar, não? Essa é uma vivência parecida com a de diversas minorias, incluindo a comunidade negra. E levando em conta o período atual, nós acreditamos que este é um bom momento para um ator negro ser escalado como Professor X e vamos explicar o porquê.
× Martin Luther King e Malcolm X
Os Estados Unidos viveram na década de 60 um momento importante no combate contra a discriminação e a favor dos direitos civis. Dois grandes líderes dessa época foram Martin Luther King, pastor e líder dos direitos humanos e principalmente do povo negro; e Malcolm X, ministro Islâmico de uma associação política e religiosa que buscava o resgate das raízes africanas e melhoria de vida dos afro-americanos.
Podemos separar os ideais desses dois líderes facilmente. De um lado temos o sonho de Martin Luther King, de ter negros e brancos convivendo juntos e em paz na sociedade. Malcolm X, por outro lado, pensava que os negros precisavam se afirmar na sociedade e se separar dos racistas que os maltratavam, mesmo que o uso da força fosse necessário as vezes. Consegue perceber a semelhança com os personagens dos quadrinhos? Se a ideologia do Professor X é baseada em uma figura histórica negra, a ideia do personagem ser negro em uma única versão não me parece absurda.
“Me ocorreu que: e se ao invés de serem apenas heróis que todos admiravam, eu fizesse outras pessoas temerem e suspeitarem e realmente odiá-los porque eram diferentes? Eu amei essa ideia. Não apenas os tornou diferentes, mas também era uma metáfora para o que estava acontecendo com o movimento dos direitos civis do país na época”
Stan Lee em entrevista para o The Guardian, 2000.
× Alinhando o discurso ao personagem
Conversar ou confrontar os humanos? Essa é a base do principal debate entre Charles Xavier, o Professor X, e Erik Lehnsherr, o Magneto. Mas verdade seja dita, essa alegoria só foi realmente oficializada no fim dos anos 70 e inicio dos anos 80 com a chegada de Chris Claremont. O roteirista afirmou que foi completamente inspirado pelo discurso de Martin Luther King e indícios disso podem ser vistos em Deus Ama o Homem Mata.
Foi nessa época que o mestre do magnetismo deixou de ser apenas um vilão e mostrou que suas motivações só existiam devido à discriminação que sofreu durante toda a sua vida. É sempre bom ressaltar que não foi especificamente Stan Lee quem criou essa alegoria. Ainda assim, já nos anos 60, Lee, embora não fosse um ativista, estava completamente alinhado com os direitos civis.
“Intolerância e racismo estão entre os males sociais mais mortais que assolam o mundo hoje. É totalmente irracional, claramente insano condenar uma raça inteira — desprezar uma nação inteira — para difamar toda uma religião. Cedo ou tarde, precisamos aprender a julgar um ao outro por nossos próprios méritos. Mais cedo ou mais tarde, se um homem é digno de seu destino, devemos encher nossos corações de tolerância”
Stan Lee em sua coluna “Soap Box”, 1968
Tendo compreendido essa metáfora, é possível perceber que um homem negro interpretando Charles Xavier não seria estranho, muito pelo contrário, na verdade cairia como uma luva.
× A busca por reparação e representatividade
É certamente de conhecimento geral que grande parte das histórias em quadrinhos representam no papel a desigualdade vivida na vida real. Uma pesquisa de 2018 aponta que, em certos momentos da história dos quadrinhos, para cada 100 personagens, apenas 5 deles são negros. Não apenas isso, também aponta que, nessa década, um personagem negro novo demora cerca de 14 meses para ser criado ou lançado. Uma disparidade, visto que, no mesmo período, um novo personagem não-negro é criado ou lançado a cada 36 dias.
É importante lembrar que a imensa maioria dos personagens que estão sendo ou serão adaptados nos filmes foram criados nos anos 60, 70 e 80. Épocas essas, em que a representatividade de personagens não-brancos era quase nula, principalmente se comparada com a quantidade de personagens brancos.
Ao contrário de personagens racializados, que normalmente possuem toda a sua história ligada a sua etnia, personagens brancos costumam ser brancos simplesmente porque é a forma como seus criadores vêem ou viam o mundo. A cor da pele destes últimos é completamente irrelevante para o andamento de sua história. E é por isso que alguns deles são boas opções para terem sua etnia modificada a fim de trazer um pouco mais de representatividade para as obras.
× A quebra de alguns estereótipos
O negro piadista, a negra raivosa e o negro criminoso, estes são três de uma série de estereótipos racistas que costumamos ver nos filmes de Hollywood. Estereótipos que, independente da qualidade dos filmes, destacam negros como pessoas unidimensionais, com essas características sendo suas únicas relevantes.
Charles Xavier é o oposto dos estereótipos que estamos acostumados. Caso um ator negro seja escalado, teríamos, então, um personagem complexo, com ações extremamente bondosas, e outras completamente condenáveis dependendo do ponto de vista (a dualidade de Charles foi uma das poucas coisas que X-Men: Fênix Negra conseguiu mostrar bem). Tudo isso, vindo de um homem negro, deficiente físico (algo incomum para negros nas telas), rico, completamente respeitado em todo o universo Marvel. Consequentemente, teríamos T’Challa como um rei influente em tecnologia, Nicky Fury e sua influência no meio militar, Valquiria sendo a soberana de Asgard e por fim, Xavier, um dos se não o mais respeitado mutante.
× Saindo da zona de conforto
Se temos os estereótipos dentro dos filmes, sobra a uma parcela de atores, então, ter de se contentar e aceitar esses papéis. Entregar a um ator preto um papel de tamanha importância, sem relacionar ele aos já conhecidos papéis de empregado, comediante, escravo ou criminoso, significa quebrar os padrões estabelecidos por uma sociedade racista, que reluta em se livrar de seus hábitos prejudiciais.
Enquanto para um ator branco ou atriz branca interpretar um personagem poderoso, relevante e influente em uma sociedade como a nossa não seja algo incomum, isso é completamente fora dos padrões estabelecidos por Hollywood para pessoas não-brancas. Parece algo irrelevante para pessoas que não são discriminadas diariamente, mas para aquelas que sofrem isso na pele, ganhar mais uma representação de alguém semelhante a você em qualquer aspecto faz uma enorme diferença.
× E se transformassem a Tempestade ou o Pantera Negra em brancos?
Geralmente alterar a cor da pele de personagens não-brancos é sinônimo de fazer eles se tornarem outros personagens, com outras vivências. Isso porque mudar a etnia de personagens negros (ou não-brancos em geral) normalmente significa uma alteração de toda a sua história. Sua essência seria modificada visto que suas origens se baseiam em suas etnias, na discriminação e no descaso que seus povos sofrem por serem negros. Há alguns personagens não-brancos que não possuem essa conexão com suas origens, mas no caso de Tempestade e Pantera Negra, isso não acontece.
Após a morte de seus pais no Egito, pobre e sem expectativas de vida, a pequena Ororo Monroe se vê obrigada a se tornar uma ladra para sobreviver. Foi no continente africano inclusive, que ela conheceu Charles Xavier e seu inimigo Amahl Farouk, o Rei das Sombras. Anos depois, ficou conhecida como deusa do tempo no Quênia, quando buscou suas origens e passou a ajudar tribos locais fornecendo água. A história de T’challa também é toda baseada em sua origem africana, além do que, o próprio nome do herói tem semelhança com o Partido dos Panteras Negras, uma organização que foi criada para lutar contra a brutalidade policial direcionada a população afro americana. O mesmo vale, por exemplo, para Magneto, personagem branco, mas que é de origem judia, com seu histórico baseado em uma Polônia dominada por nazistas.
Dessa forma, é possível perceber que há uma diferença entre Tempestade e Magneto, se compararmos com personagens como Nick Fury, ou o próprio Professor Xavier. Nos dois últimos, a mudança de etnia não só não altera a origem deles, como pode até acrescentar mais complexidade aos personagens. Além disso, um homem branco e rico liderando uma equipe é algo que já vimos nos filmes de heróis recentes.
Por fim, não é nem preciso comentar o fato do quão injusto seria pegar personagens de etnias mal representadas nas mídias em geral, e remover os poucos personagens que as representam, deixando eles iguais aos inúmeros personagens que já temos aos montes. Novos Mutantes com Mancha Solar e Cecilia Reyes brancos, é um exemplo recente.
× Mas já tem personagens negros, por quê não usá-los ou criar novos?
Há sim diversos mutantes negros que merecem destaque, mas não podemos fingir que as mídias não escolhem os personagens mais populares para destacar. Poucos são os heróis negros que estão entre os favoritos do público, alguns deles por negligência de roteiristas, outros por não cativarem os leitores. O fato é que não é tão simples assim fazer o público comprar a ideia de um personagem. E se é difícil fazer isso com personagens criados há anos, imagine então criar novos personagens 80 anos depois da popularização dos super-heróis. Tempestade e Bishop possuem alta relevância e provavelmente serão muito bem explorados no MCU, mas não podemos ficar apenas neles, ou nos poucos personagens negros que temos por aí.
Convido você a fazer um exercício, sem usar o Google, você consegue falar sobre 8 mutantes negros e seus poderes, sem citar a Tempestade? Acredita que a maioria das pessoas que lerão esse artigo consiga citar esses nomes?
É possível perceber, que diferente de mutantes negros, é inegavelmente mais fácil citar um número bem superior a 10 mutantes brancos. Essa é outra injustiça que a alteração de etnia de alguns personagens visa reparar.
× Falando sobre rumores
Tendo todos esses argumentos apresentados, vamos falar sobre rumores. Mais ou menos um ano atrás, o site Full Circle Cinema trouxe a tona a informação de que segundo a fonte deles, a Marvel estava interessada em escalar pessoas racializadas para interpretar o Professor X e o Magneto. Ou seja, a Marvel Studios estava considerando fazer Charles Xavier e Erik Lensherr pessoas não-brancas nos cinemas.
Como estamos falando de rumores, não é possível saber a veracidade da informação, mas por esse momento, vamos assumir que essa informação seja verdadeira para comentar sobre o assunto.
De origem judia, nascido Max Eisenhardt, Erik Lensherr, também conhecido como Magneto, nasceu na Alemanha e ainda criança foi para a Polônia. Perseguido, teve sua família morta por nazistas, foi capturado e mandado para o campo de concentração de Auschwitz. Viveu lá por algum tempo e se viu obrigado a trabalhar para os nazistas até conseguir fugir. Somente por esse resumo, é possível perceber que a etnia de Magneto é extremamente importante para sua essência como personagem. Este é um personagem cuja alteração poderia desvirtuá-lo completamente, portanto, as reclamações com relação a mudanças referente a Magnus são completamente compreensíveis.
É válido citar no entanto, uma argumentação relevante com relação a uma mudança de etnia de Magneto. Os filmes do MCU são ambientados pós 2010, e com Magneto aparecendo pós 2020, para ter sido um prisioneiro dos nazistas, Erik teria que ter entre 90 e 100 anos. Caso a Marvel não consiga manter a origem do personagem de forma plausível, será necessário mudar sua origem. Historicamente falando, fazê-lo uma vítima do Apartheid talvez seja uma forma de manter a origem de Magneto mais próxima da original. Mas isso é assunto para outro debate.
Se de um lado temos Magneto com sua etnia como algo importante, Xavier por outro lado, é justamente o contrário. Charles Francis Xavier, estadounidense, filho de pai cientista e mãe dona de casa. Uma origem comum, que não faz muita diferença para o personagem, e que nos leva a outros rumores.
×Giancarlo Esposito
Segundo rumores, o ator de Breaking Bad, Giancarlo Esposito, poderia estar em reuniões para interpretar um personagem grande dentro do MCU. Levando em consideração os rumores de que o Professor X poderia aparecer em Doutor Estranho 2, não seria uma surpresa se um ator do calibre de Esposito ganhasse o papel.
No entanto, como citado acima, tudo não passa de rumores. Não sabemos se a intenção da Marvel é trazer realmente um Professor X negro, e se sim, não é possível saber se Giancarlo é a escolha correta. No entanto, uma coisa para nós é fato, levando em conta o período histórico de combate ao racismo que estamos vivendo, este é o melhor momento para termos um Professor X preto liderando os X-Men.
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