QUADRINHOS

Primeiro super-herói gay das HQs é um mutante! Confira sua trajetória

O Universo Marvel que conhecemos começou em 1961, com o lançamento do Quarteto Fantástico #1. Mas apenas 30 anos após sua criação é que tivemos a oportunidade de ver pela primeira vez um herói se assumir gay. Esse herói? O campeão olímpico de esqui Jean-Paul Beaubier, ou Estrela Polar.

A razão para essa demora ter acontecido, além do conservadorismo dos escritores, é que a Autoridade do Código de Quadrinhos de 1954, um departamento de censura que policiava o conteúdo de HQs, proibia explicitamente referências claras à homossexualidade.


Então, como você escreve um personagem LGBTQIA+ em um momento em que os quadrinhos são expressamente proibidos de caracterizar personagens assim? Em uma palavra: sutilmente.

Confira a trajetória do primeiro herói gay da Marvel e como ele quebrou barreiras dentro do mundo dos quadrinhos.

A representatividade dos X-Men

Estrela Polar faz parte equipe de super-heróis totalmente canadense patrocinada pelo governo, Tropa Alfa. A equipe apareceu pela primeira vez nas páginas de X-Men em 1979 e ganhou sua própria série em 1983, criada pelo artista e escritor John Byrne e pelo icônico escritor de X-Men, Chris Claremont.

Na época, os quadrinhos dos X-Men já eram tidos como uma representação da diversidade e minorias, principalmente a LGBTQIA+. Portanto, não é surpresa que o primeiro super-herói gay da Marvel apareça nessa equipe.

Estrela Polar por John Byrne

Byrne disse que a sexualidade do personagem já foi definida nos bastidores assim que a Tropa Alfa ganhou sua própria série nos quadrinhos, e completou:

“É preciso haver gays nos quadrinhos porque existem gays na vida real. É isto. A população do mundo ficcional deve representar o mundo real. Foi por isso que criei o Estrela Polar, senti que o Universo Marvel precisava de um super-herói gay (mesmo que eu nunca pudesse dizer isso em tantas palavras nos próprios quadrinhos), e senti que deveria criar um, em vez de adaptar um personagem existente.”


A indicações sempre estiveram lá

A sexualidade do Estrela Polar aparece pela primeira vez em Tropa Alfa #7 (1983), quando ele encontra “um velho amigo” chamado Raymonde, que é fortemente sugerido como um ex-namorado. Na história, escrita por Byrne, Raymonde comenta sobre a boa aparência de Jean-Paul e faz referência à natureza secreta de seu relacionamento com ele:

“Então você realmente contou tudo a sua irmã tudo sobre mim, afinal, Jean-Paul? Eu pensei que teria seria estranho.”

Quando Raymonde é assassinado mais tarde, Estrela Polar fica cego de raiva, enquanto a legenda narrativa da história diz: “E Raymonde foi a segunda pessoa mais importante na vida dele… mais do que um amigo… o levou para fora desse medo sombrio, para a luz clara da auto-aceitação, ensinado”.

Em 1983, a narrativa de um ex-amante sendo assassinado e, assim, estimulando o super-herói à ação e erupção emocional já era um clichê dos quadrinhos. Mas ao mostrar isso através de um casal do mesmo sexo, estabelece uma espécie de validação subtextual do relacionamento do Estrela Polar como algo mais do que o rótulo de “perversão sexual” da Autoridade do Código de Quadrinhos de 1954.


Vampira sabia do segredo

Dois anos depois, na série limitada X-Men e a Tropa Alfa (1985), a sexualidade do herói é mais uma vez tecida em uma história importante, desta vez escrita por Claremont. Depois de ter sua consciência absorvida brevemente pela Vampira, Estrela Polar fica furioso por ela agora conhecer seus “segredos”.

“Você não tinha esse direito” afirma Estrela Polar

Em uma tentativa equivocada de ajudar Jean-Paul, Vampira pede que ele dance com ela em um evento público. Quando os colegas de equipe zombam dele pela incoerência dele estar dançando com uma mulher num baile, Vampira pensa: “Nenhum de vocês o entende como eu”.

Jean-Paul leva Vampira para a dança. Ela comenta: “Você não precisa”, ao qual ele responde: “Sim, Vampira. Eu faço.”

No nível literal, Estrela Polar pode parecer estar sendo ridicularizado pelo seu desinteresse em um romance heterossexual, mas Claremont está elaborando a história de um homem que luta com sua sexualidade reprimida diante das pressões sociais. Era uma representação do personagem que ajuda a normalizar o conceito de um super-herói gay, mesmo que a Marvel não pudesse identificá-lo dessa maneira na época.

Grito de Liberdade, a saída oficial

Não foi até 1992, três anos após uma grande revisão no Código dos Quadrinhos abrir oficialmente a porta para representações de personagens LGBTQIA+, que a Marvel resolveu assumir o herói abertamente como gay. Na Tropa Alfa #106, escrito por Scott Lobdel, o personagem Estrela Polar declarou: “Eu sou gay”.

“Por enquanto, não estou afim de discutir minha sexualidade com pessoas que não tem nada a ver com isso. Eu sou Gay!…. Aids não é uma doença restrita aos homossexuais como parece para o resto do mundo”

Mesmo assim, essa iniciativa foi recebida com indignação pela liderança corporativa da Marvel, explicou o Sean Howe, em seu livro Marvel Comics: A História Secreta. Vinte anos depois, Estrela Polar também participaria do primeiro casamento homossexual da Marvel, um evento histórico que foi destacado na capa de surpreendentes X-Men #51. Na época, a Marvel fez um grande anúncio na TV, com o intuito de deixar universo mais inclusivo e progressivo.

Jean-Paul se casa com o humano Kyle Jinadu em Surpreendentes X-Men #51 (2012).

Até o dia que está matéria foi publicada, Jean-Paul e Kyle ainda estão juntos e aparentemente muito felizes vivendo em Krakoa. Kyle tem permissão para estar no estado-nação mutante ao lado de seu marido, atuando em várias missões. O casal terá mais destaque na nova série da X-Factor, prevista para ser lançada neste ano.


Estrela Polar

Seja através de entrelinhas sutis ou seu casamento aberto, Estrela Polar ocupa uma posição de destaque e, às vezes, comovente na história dos super-heróis LGBTQ+. À medida que entendemos a importância da representação diversificada dentro do gênero dos super-heróis, esse é um personagem que precisa ser conhecido, discutido e apreciado.

Fonte: The Conversation